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Sempre Haverá um Futuro

Por Eguinaldo Hélio de Souza

 

O amanhã é inevitável. Inexoravelmente tudo caminha para ele e a ele se destina. Na ampulheta do universo a areia escorre e não pode ser contida de forma alguma. A cada momento, segundo a segundo, o futuro chega e a forma definitiva que ele tomará em sua plenitude tornar-se-á evidente em algum momento. A verdade é que o futuro existe, senão como fato, ao menos como certeza, pois sempre haverá um amanhã, seja ele qual for.

Nada nem ninguém foge do amanhã. Existir é rumar para o futuro.  De fato, o futuro não nos pertence, mas nós definitivamente pertencemos a ele. Sei que tudo o que Deus faz permanecerá para sempre[1], escreveu o Eclesiastes. Não por acaso nosso Deus é El Olam, o Deus Eterno[2]. A lei de Lavoisier, onde nada se perde, nada se cria, tudo se transforma, contém um pouco dessa verdade. E quanto se trata de nós, da humanidade e do mundo não conseguimos deixar o assunto de lado. Quem pode pensar, pensará a cerca do futuro. De certo modo, tudo mora na “mansão do amanhã”[3], para usar uma expressão de Gibran.

Profecias, oráculos, máquinas do tempo, bolas de cristal, previsões futurísticas e outros tantos elementos exprimem esse desejo do ser humano de conhecer o amanhã. Não lhe basta escavar o que passou ou presenciar o hoje. Ele também deseja ver o amanhã ou se possível, ser o dono dele.

O fim vem! O fim vem! É o grito repetido pelo profeta que tem poder para tirar o homem do seu sono, o operário do seu trabalho, os noivos de sua recâmara, e levar todos eles a uma reflexão detida sobre suas vidas. Eles querem um futuro e precisam sentir merecer esse futuro. Nem só pão vive o homem. De esperança também vive ele.

Viver somente o hoje sem pensar no amanhã não anula o futuro de forma alguma. Ele tem sua existência independente de nossa vontade, de nossas opiniões, de nossas crenças. Ele vem e chegará com certeza, mesmo para aqueles que procuram ignorá-lo e quando ele chegar trará a resposta para muitas perguntas que dominam hoje o cenário da humanidade. E mesmo para aqueles que nada perguntaram. Quando o futuro chegar ele não se importará com os enganos e mentiras espalhados ao longo do tempo. Ele será o cumprimento exato do que deve ser. Ele vai expor a verdade e destruir completamente a mentira.

De certa forma, o futuro é como Deus, completamente invisível aos sentidos, mas real. Só pode ser alcançado pela fé. Sua existência é simultaneamente um mistério e um axioma.

É quase impossível existir e não pensar nesse amanhã, seja o amanhã imediato, seja o amanhã longínquo. Todas as pessoas estão plenamente cientes de que o mundo se move em alguma direção por mais oculta que ela esteja e, portanto tentam penetrar nesse espesso véu para descobrir como será o futuro. Esse futuro ocupa boa parte de nossos pensamentos, anseios, reflexões. O amanhã existe e nos incomoda, não apenas o amanhã individual, mas também o amanhã universal, o amanhã cósmico. Quando trabalhamos, lutamos, sofremos, nós o fazemos pelo amanhã. Para nós hoje, tudo é semente. O fruto está no porvir.

Por estranho que pareça, passado e futuro ocupam mais a mente do ser humano do que propriamente o presente. Lembranças e expectativas constantemente deslocam o homem de hoje e o transportam para longe do seu agora. Lembranças e expectativas boas geralmente o alegram e estimulam, mas quando não boas produzem os traumas e a ansiedade. De qualquer forma, esse transporte a outros tempos muitas vezes reduz sua existência atual em uma corrente de águas que flui por entre os seus dedos e por isso ele não desfruta do seu agora. Seu lamento pelo ontem e seu anseio pelo amanhã tornam seu hoje algo menos do que deveria ser. Sobre isso se expressou Blaise Pascal:

Nunca nos atemos ao presente; apropriamo-nos antecipadamente do futuro, como se ele viesse muito devagar, como se quiséssemos acelerar-lhe o passo; lembramo-nos do passado como para segurá-lo, já que desaparece muito depressa. Que insensatez errar por tempos que não são nossos e esquecer o único que nos pertence; que vaidade correr atrás dos que não existem e perder o único que tem existência… Raramente pensamos no presente, e se pensamos nele só o fazemos para acender a luz de que queremos dispor no futuro.  Nunca o presente é meta; presente e passado são meios, o futuro somente é a nossa meta. Assim nunca vivemos, mas esperamos viver; e assim é inevitável que nós, prontos sempre a sermos felizes, nunca o somos. (Pensamento 172).

Como podemos perceber a relação do homem com o futuro é uma ligação muito estreita e impossível de ser ignorada. E se escatologia, o estudo do escathos, das últimas coisas, diz respeito ao futuro, então ela não pode de forma alguma ser ignorada. Ela é parte inerente da existência. Se é para pensar sobre o futuro, pensemos segundo Deus.

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[1]Eclesiastes 3.14 (NVI)

[2] Gênesis 21.22

[3] GIBRAN, Kalil. O Profeta. Rio de Janeiro: Mansur Challita. P. 16

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