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A Igreja Evangélica Atual e os Judeus Messiânicos – Parte 2

Por Eguinaldo Hélio de Souza

O triste desvio dos grupos judaizantes

Até aqui, temos exposto apenas um lado da moeda. Como geralmente o comportamento humano é pendular, indo de um extremo ao outro, surgem, a cada dia,grupos que distorcem o legítimo movimento judaico-messiânico e podem ser apontados como movimentos judaizantes. Um dos mais expressivos é a Congregação Israelita da Nova Aliança, que possui amplo trabalho de mídia. Conforme sua própria declaração, ela rejeita o protestantismo e propõe um cristianismo judaico, mesmo para os não-judeus.

“A Kehilah (Congregação/Igreja), a exemplo de Judá no tempo do cativeiro babilônico, se descaracterizou pela apostasia e pela mistura com os costumes e práticas religiosas pagãs, que começou logo após a morte dos apóstolos e teve seu ápice na união com Constantino, no século 4o. Felizmente, um remanescente dessa mesma Kehilah, guardado por Deus a partir do século 4º, tem ultimamente resgatado suas raízes de noiva judia do primeiro século e restaurado a liturgia, a forma de adoração e as tradições de nosso povo Israel que aceitou a nova aliança [...] Não obstante, à medida que avançamos em nossa teshuvah (arrependimento), em busca do aperfeiçoamento, vamos nos distanciando do protestantismo, que, de certa forma, nos serviu de referência [...] A Kehilat Elohim não é uma Congregação envolvida com o paganismo da religião romana e com a Reforma Protestante do século 16. Por isso, o que antes tinha tomado emprestado do protestantismo, não lhe foi difícil abandonar. Teshuvah (arrependimento) para nós, nada mais é que assumirmos as características que tínhamos nos dias de Yeshua (Jesus). (grifos do autor).[1]

Com estes discursos eles se colocam acima e além do cristianismo, rejeitando inclusive a Reforma Protestante.

A negação da Trindade entre os judaizantes

Sua posição diante da divindade de Jesus e do Espírito Santo não é clara. Ao primeiro, o movimento nega a divindade e,quanto ao segundo, acredita em uma identificação plena entre o Espírito Santo e o Pai, como uma espécie de modalismo, conforme apresentado em seu credo, que assim se expressa em três pontos:

“Cremos em Yeshua  HaMashiach (Jesus, o Messias), o Verbo que se fez carne, tornando-se totalmente humano para submeter-se à morte e ressuscitar para nos dar vida eterna. Ele é o único Filho unigênito de Deus, e é o Messias de quem falaram os santos profetas. Nos dias de sua carne, foi tentado, todavia,nunca pecou, tornando-se advogado e mediador entre Deus e o homem”.

“Cremos em um Deus, o Pai, o Deus de Israel, eterno, ser pessoal de inteligência suprema, conhecimento, amor, justiça, poder e autoridade. Ele é o único Deus (echad)”.

“Cremos que o Ruach HaKodesh (Espírito Santo) é o próprio Deus (não é uma outra pessoa ou terceira pessoa), atuando como poder ou força de Deus na conversão do pecador e na orientação da Kehilah e da liderança congregacional em toda a verdade e entendimento das Escrituras”.[2]

Quatro pontos a serem considerados sobre o credo judaizante

1. A argumentação segue a mesma dos movimentos sectários modernos. Semelhante ao que ensinam os mórmons, as testemunhas de Jeová, os adeptos da Missão Nova Vida e tantos outros, o verdadeiro evangelho teria se corrompido a partir do tempo dos apóstolos e depois completamente modificado pelo imperador Constantino. Eles são os restauradores. A Igreja não teria existido ou teria existido em número bastante reduzido, para voltar a renascer agora no tempo do fim. Entretanto, Jesus disse que nem mesmo as portas do inferno prevaleceriam contra a Igreja que Ele estava edificando (Mt 16.18). A Bíblia declara que os últimos tempos são marcados por apostasia e não por restauração (1Tm 4.1).

2. O conceito de “noiva judia do primeiro século” é pura distorção. No máximo se pode falar de noiva judia dos primeiros dias,quando nenhum gentio havia sido alcançado pelo evangelho. Logo nos primeiros tempos, os gentios aceitaram o evangelho e a noiva de Cristo foi formada tanto por judeus quanto por gentios,conforme o plano de Deus (At 11.20-23; 17.4; 28.28; Ef 2.14-18; 3.6).

3. Abandonar os princípios teológicos da Reforma Protestante equivale a abandonar os princípios da própria Bíblia. Salvação unicamente pela graça, pela fé em Jesus Cristo, é a essência do Novo Testamento. Negar isso é negar a Palavra de Deus.

4. Em nenhum momento, a ideia de arrependimento (teshuvah) esteve ligada ao compromisso de assumir alguma semelhança com os judeus,até porque os primeiros discípulos eram todos judeus. No caso dos gentios, os apóstolos (todos eles judeus) foram unânimes em reconhecer que não precisavam tornar-se judeus de modo algum (At 15), invocando,para isso,até mesmo a concordância do Espírito Santo (At 15.28).

Os excessos nocivos dos elementos judaicos

Não é preciso falar muito sobre o prejuízo dos excessos! “Achaste mel? Come o que te basta, para que porventura não te fartes dele, e o venhas a vomitar.” (Pv 25.16). Muitos grupos, tentam expressar seu amor por Israel e seu pesar pela atitude negativa da Igreja em relação aos judeus ao longo dos séculos, tem inserido descomedidamente elementos judaicos no seu culto e liturgia. Não tendo eles nenhum traço real de descendência judaica, agem como se tivessem. Passam indiscriminadamente sobre a distinção bíblica entre judeu e gentio. Quase chegam a transformar suas igrejas em sinagogas.

Era justo que Jesus agisse como um judeu, pois Ele foi “ministro da circuncisão” (Rm 15.8).Era justo que Paulo fizesse votos conforme a lei mosaica, porque ele era um judeu(At 21.20-24), da tribo de Benjamim(Fl 3.5).Era compreensível que Paulo mandasse circuncidar Timóteo,porque Timóteo era um judeu(At 16.1,2).Todavia, Paulo jamais permitiria que o mesmo fosse feito como gentio Tito (Gl 2.3). E mesmo Tiago, o líder da Igreja em Jerusalém,por mais forte que fosse o teor judaico de sua fé,não aceitou que aos gentios fossem impostas as práticas dos judeus(At 21.25).

Além de problemas de ordem teológica, existem problemas de ordem prática nessa questão. Ouso dos símbolos judaicos pelos não-judeus,embora seja uma tentativa de lhes parecer simpáticos, podem ter efeito inverso quando não são tratados com a mesma reverência e respeito que os judeus lhes dedicam.

Isso não significa que seja proibido o uso de elementos judaicos dentro da liturgia. Na verdade,nossa liturgia sempre reuniu elementos da cultura européia e hoje tem sido ainda mais diversificada com instrumentos e ritmos de outras culturas. Eliminar o elemento judaico da liturgia seria discriminação e, de certo modo,um erro, uma vez que a nossa herança judaica tem sido cada vez mais destacada. Na verdade, trata-se de um enriquecimento do culto e nada tem a ver com os “judaizantes” do período apostólico,que desejavam transformar gentios em judeus.

As heresias dos nomes hebraicos

Outras heresias que têm proliferado são as que envolvem os nomes hebraicos de Deus e de Jesus. As testemunhas de Jeová já haviam insistido na questão da pronunciado nome,que indubitavelmente seria “Jeová”, o que depois se revelou uma impossibilidade.

A Organização Yaohúshua (ou Yawhushua), baseada em Jerusalém, Israel, é um fenômeno relativamente recente. Liderada por alguém que é meramente identificado como Cohanul, o grupo busca prosélitos por meio de salas de chat na Internet e no seu website oficial: http://www.yaohushua.org. Apesar de Cohanul alegar liderar o único grupo que conhece a verdadeira identidade do Criador, a verdadeira identidade do próprio Cohanul é suspeitamente obscura,um fato que desabona a credibilidade escolástica do seu movimento. A seita Yaohúshua é a última na série de grupos classificados como “o nome sagrado”ou como movimento de “raízes hebraicas”até o momento.

Outros grupos são identificados pela designação geral de Adeptos do nome de Yehoshua. Alegam ser impossível a salvação a não ser que seja utilizado o nome de Jesus conforme o hebraico,embora a pronúncia exata do nome vari e amplamente entre os diversos grupos. Ainda outros elementos “judaizantes” e herético sem vários sentidos estão presentes:

1. Alguns negam a inspiração do evangelho de Mateus,sob alegação de que é um livro apócrifo.
2. Alguns ensinam que o nome correto de Jesus é Yehoshua e que Jesus significa “deus-cavalo”.
3. Alguns fazem ligação entre Jesus (no grego Iesous) e Esus, um deus celta, pretendendo,comisso,afirmar que os evangélicos são pagãos.
4. Alguns ensinam que o número 666 (número da besta referido em Apocalipse 13.6,18) se enquadra ao nome de Jesus.
5. Alguns negam o nascimento virginal de Jesus e ensinam que Ele foi filho natural de José e Maria.
6. Alguns negam a doutrina da Trindade e afirmam que o Pai é o Filho e o Filho é o Pai (espécie de unicismo).
7. Alguns ministram o batismo em nome de Yehoshua-Mashiach.
8. Alguns creem em duas classes de pessoas: os cristãos, que vão para o céu; e os judeus, assírios e egípcios, que herdarão a terra.
9. Alguns negam a salvação de quem invoca o nome de Jesus. Só há salvação para quem invoca o nome Yehoshua.
10. Alguns ensinam a guarda do sábado com o fator necessário à salvação.
11. Alguns rejeitam o uso do título“cristão”, dizendo que tal predicado foi dado aos seguidores de Cristo para escarnecer deles, sendo,logo,um título pagão.
12. Alguns observam festas e dias tipicamente judaicos. Outros usam véu, praticam lava-pés, ósculo santo, comem pães ázimos, etc.[3]

Os debates teológicos suscitados em voltada pronúncia hebraica correta dos nomes de Jesus ou de Deus têm sido desgastantes. Longe de restaurarem alguma coisa, têm produzido uma miríade de pronúncias diferentes. Não há qual quer indicação nas Escrituras de que Deus quisesse a língua hebraica como língua sagrada. O amplo uso da Septuaginta, versão do Antigo Testamento em grego, e a própria utilização do grego nos escritos do Novo Testamento testificam isso.

Buscando o equilíbrio

A Igreja não pode aprovar a “israelização”ou“judaização”, bem como o anti-semitismo. O reconhecimento de uma hostilidade injusta e da rejeição indevida a certos aspectos judaicos dentro do cristianismo é saudável, mas não pode ser corrompido por aqueles que desejam introduzir doutrinas estranhas.

Sabemos que “não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há homem nem mulher; porque todos nós somos um em Cristo Jesus” (Gl 3.28). E assim como em Cristo homem e mulher não perdem suas respectivas identidades, dentro do Corpo de Cristo, gentios e judeus também não perdem as suas, apenas se unem a algo maior, que é a Igreja. A Igreja, composta por ambos os elementos, judeu e não-judeu, acessa o Pai em um único Espírito (Ef 2.19). Não deixando de ser “ambos”, permanecem “um” nele. Esse deve ser o nosso posicionamento!

OlhoComo uma criança que após crescer destrói seu berço, assim o cristianismo, ao assumir a maioridade, passou a hostilizar toda sua herança judaica


[1] http://www.israelitas.com.br/institucional/quem.php

[2] http://www.israelitas.com.br/institucional/cremos.php

[3] SOUZA, Eguinaldo Hélio de. Evangelismo dos adeptos de Yehoshua. In: Curso de Apologética Aplicada. Jundiaí: FAETESF, 2009, s/p.

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